Paixão, Engenho e Vocação: a Luz com Sentimento

Ed Caliban
Revista Caliban issn_0000311
3 min readApr 15, 2018

--

José Luís Carvalhosa

Ana M. M. Santos (UBI)

Na imponência de uma antiga parada militar, sob a luz de um setembro ainda quente, encontrava-se um homem que calmamente degustava o seu cachimbo e apreciava o sol num compasso de espera pelos alunos que chegariam, minutos depois, para a sua primeira aula. Foi assim que conheci o Professor Doutor José Luís Carvalhosa, docente de fotografia e imagem, cujas aulas sempre foram inundadas de sabedoria e boa-disposição.

Dentro da ficção e do documentário, a sua obra é vasta. O seu percurso como diretor de fotografia foi brilhante, começando com séries como Duarte & C.a (1985), Crime à Portuguesa (1987), ou Cinemazine (1988–1995); passando por documentários como Gestos e Fragmentos (1983), de Alberto Seixas Santos, A Luz Submersa (1999), de Fernando Matos Silva, ou mais recentemente Ainda Não Acabámos: Como se Fosse uma Carta (2016), de Jorge Silva e Melo; até filmes como Actos dos Feitos da Guiné (1980), de Fernando Matos Silva; Antes a Sorte que Tal Morte (1981), de João Matos Silva, ou Filha da Mãe (1990) de João Canijo.

A evolução é notória e mostrou, a quem conhece o seu trabalho, que com talento, técnica e labor é possível tornar-se num profissional de excelência. A sua carreira sempre foi um exemplo e um incentivo para nós, estudantes, que estávamos a dar os primeiros passos por caminhos cinematográficos, e dentro do cinema em português.

Durante o triénio em que fui sua aprendiza, pude adentrar pelos meandros da iluminação, desde uma cena simples, passando pela noite americana, até à complexidade que requer um qualquer plano no film noir. Recordo que o meu melhor e mais estimulante exercício de fotografia, recaiu sobre uma cena no género neo noir, onde se impunha a perfeita comunhão entre a luz quente de um espaço que deveria ser inundado na sua maioria por penumbra, e o frio de um candeeiro de rua que atravessava uma persiana e incidia de forma cortante no rosto do detetive e da femme fatale.

Entre projetores e filtros, cada aula era um estímulo à nossa capacidade crítica, com o tempo necessário e a complexidade da exigência, para a criação das cenas que nos pedia. Perante o nosso erro ou fracasso, existia sempre uma palavra amiga que, com a paciência de um homem sábio, nos explicava cada passo que demos em falso, e nos mostrava como, afinal, era simples iluminar o cenário.

Foi com este mestre que desvendei a magia por trás de uma câmara analógica, a beleza que pode existir no grão da película, e a capacidade de brincar com o obturador e o diafragma da câmara de modo a obter fotografias consoante a minha criatividade. O mesmo conhecimento que pode ser transposto para o digital. Graças a esses ensinamentos, não só alarguei os horizontes no campo intelectual, como melhorei as imagens que captava do mundo, até à data tiradas sempre em modo automático.

Com um sorriso pronto a oferecer, uma cultura nata e um lado humano excecional, estimulando intelectualmente a quem ensinava, a sua partida deste mundo nunca será um adeus, mas um “até já” ao homem que será sempre recordado carinhosamente pelos seus alunos como o Mestre da Fotografia.

--

--